Lúcia Vaz Pedro

SILÊNCIO

kurt-underwater-6

Sentir assim este silêncio. Passar por ele e ele por mim.
Transportá-lo pela cidade no fundo do coração.
Sentir assim este silêncio. Guardá-lo como um tesouro. E deixar que me cubra enquanto durmo.
Senti-lo assim, pousado em mim. Semeá-lo pelas estradas. E deixar que renasça em cada amanhecer.
Senti-lo perto e tão profundo para que me abrace, despedaçando-me o corpo, aniquilando-me alma.
Emudece-a até à ponta dos cabelos.
Descolora-a até à ponta dos pés.
Suga-a, veia a veia, devagarinho.
Saboreando cada aresta de ruído, cada esquina de som.
Silêncio opaco, sentir-me assim, na palma das tuas mãos.
E escorregar pelo teu pescoço,
E deslizar pelo teu ventre,
Até sufocar o grito na garganta.
Silêncio branco.
Silêncio meu.
E ser só tua. E seres só meu.

Lúcia Vaz Pedro

Arn Anderson, ‘Annihilation’