Dantas Rodrigues

Advogado

Visitas íntimas nas prisões

Por Dantas Rodrigues, sócio-partner da Dantas Rodrigues & Associados

Embora não seja prática corrente, é um facto indesmentível que ainda ocorrem violações dentro dos estabelecimentos prisionais. E, prova disso, foi o recente julgamento e condenação pelo tribunal de Aveiro de um recluso a uma pena de cinco anos por ter violado uma reclusa. Justificação do violador pelo seu ato, e cito: «apetite sexual».

Sabemos que nada pode, nem deve, justificar uma violação, mas também não é menos sabido que o exercício da sexualidade é inerente a todo o ser humano, como uma das suas funções biológicas e psíquicas essenciais, além de promotor de integração social e de comunicação com os outros e com o próprio mundo. Quando se é recluso vigora a lei da abstinência sexual, como forma errada, a meu ver, para a sua ressocialização.

Embora o Regulamento Geral dos Estabelecimentos Prisionais, em vigor desde Junho de 2011, preveja a visita íntima «a recluso que não tenha beneficiado de licença de saída jurisdicional há mais de seis meses», e que tenha bom comportamento, existe ainda o artigo 21.º do mesmo regulamento, no qual se refere que as mesmas visitas íntimas podem ser autorizadas pelos diretores dos estabelecimentos prisionais, após uma avaliação atualizada do processo individual do recluso, e ouvido o conselho técnico do estabelecimento prisional.

Já se vê que tudo isso envolve um processo burocrático que começa por um requerimento do recluso dirigido ao director do estabelecimento prisional, acompanhado de uma declaração de consentimento por parte da mulher do dito recluso. Esta tem de afirmar que «concorda com o pedido e assume a responsabilidade por todos os riscos físicos e morais que daí possam resultar». Seguidamente são elaborados dois relatórios, um da responsabilidade dos serviços de educação e outro da responsabilidade do Instituto de Reinserção Social (IRS), «no qual deve constar referência à estabilidade da relação afectiva». Só após o cumprimento de todas estas formalidades é que ao recluso poderá então ser concedido um encontro sexual por mês.

Parece-me inútil aqui recordar que a sociedade evoluiu, e a família ainda constitui, para muitos, sejam eles reclusos ou não, uma janela de afectividades. Por conseguinte, a repressão do instinto sexual – e, sobretudo, numa prisão – só pode propiciar transtornos e perversões ao nível da personalidade e dos comportamentos do indivíduo. Estamos no século XXI, mas consentimos um sistema prisional que reprime e desvaloriza o direto à sexualidade, transformando-o num beneficio que o director do estabelecimento prisional pode ou não conceder. Custa a entender tamanho anacronismo.

Preservar a familia e não contribuir para a ruptura das relações conjugais afigura-se um dever do sistema prisional e um direito do recluso. E isto, quanto mais não seja, por razões estatísticas, já que o índice de divórcios após a condenação de um dos membros do casal é muito superior ao que se verifica entre casais que desfrutam de liberdade. Está-se, portanto, perante um problema sociológico com indesmentíveis implicações antropológicas.

Facilitar o exercício da sexualidade nas prisões, só poderá contribuir para um melhor ambiente comportamental entre os reclusos, uma vez que, com a sua ressocialização, haverá menos brigas, consumir-se-ão menos drogas e diminuirão certamente as habituais práticas homossexuais e outros vícios inconfessáveis a troco de estupefacientes ou de dinheiro. Podem ser um ganho as visitas íntimas nas prisões.