Cultura

Simple Minds: Lisboa é o primeiro teste ao electro-pop de Big Music

Após um hiato de cinco anos, os Simple Minds estão de volta com Big Music, novo álbum editado em Novembro passado, complementado com uma tournée de promoção do mesmo, reunindo 59 espectáculos agendados para vários palcos europeus, até 4 de Maio numa primeira fase, com sequência de mais sete datas, numa segunda fase, de 11 a 23 de Novembro. A respeito desta first leg, a banda postaria o seguinte comentário na sua página oficial do Facebook esta segunda-feira,: “59 unique shows, with no two shows featuring the exact same setlist. 26 songs nightly x 59 = a combined total of 1,534 song performances”.

O ponto de partida escolhido por Jim Kerr & Co. foi o Coliseu dos Recreios, em Lisboa, já no próximo sábado, ao que se segue o outro Coliseu, o do Porto, no domingo. Trata-se de um regresso aguardado por antigos e novos fãs, depois da última presença da banda escocesa, também no Coliseu da capital, no Dia dos Namorados de 2012, no âmbito da promoção da colectânea 5X5 Live (antes, os Simple Minds passaram por terras lusas em 1980, como banda de abertura de um show de Peter Gabriel, e ainda regressariam em 1991, 1997 e 2002, sempre com concertos em Lisboa).
Nessa altura, e ao contrário do que provavelmente muitos esperavam, mas coerente com a própria linha do disco, o grupo de Glasgow desfilou uma lista de cinco temas de cada um dos seus cinco primeiros álbuns: Life in a Day (1979), Real to Real Cacophony (1979), Empires and Dance (1980), Sons and Fascination/Sister Feelings Call (duplo álbum, 1981) e New Gold Dream (81-82-83-84) (1982). De fora ficaram os temas mais badalados, mas permitiu àqueles que só a partir de 1985 travaram contacto com os Simple Minds aumentarem o seu conhecimento do reportório da banda escocesa.

Simple Minds

Desta feita, sendo a digressão dedicada à divulgação e promoção de Big Music, é natural que seja este o ponto dominante das 26 canções apresentadas cada noite, mas, será igualmente expectável que a banda de Glasgow brinde a plateia com alguns dos êxitos do passado, tais como Waterfront, Someone Somewhere (In Summertime), New Gold Dream (81-82-83-84), Promised You A Miracle, All The Things She Said, Sanctify Yourself, Glittering Prize, See The Lights, Alive & Kicking, Mandela Day e ainda o tema que guindou os Simple Minds à fama do lado de cá e de lá do Atlântico, Don´t You (Forget About Me).

Sobre Big Music, o 16º original da banda de Glasgow, tem a sua quota-parte de ousadia, mas também de adaptação aos novos padrões da música moderna, revelando uma produção cuidada, asseada e experiente, projectando um conjunto de temas muito homogéneo em matéria de sonoridade, um tanto afastada do conceito de “arena rock” a que nos haviam habituado.
Neste registo o grupo escocês recuou aos primórdios da carreira, dedicados à exploração do universo de uma “pop romântica” nascida na implosão do New Wave – a lembrar Empires And Dance (1980) ou Sons And Fascination (1981) – inspirado no “glamour rock” de finais de ‘70-inícios de ’80, neles buscando inspiração para, de forma inteligente e despretensiosa, adornar o seu novo som com uma roupagem bastante moderna.

Simple Minds

Os Simple Minds acabaram por optar vestir seus temas com túnicas de uma dance/tecnho pop, fazendo uso de seus habituais artefactos: sons alongados a pulsar com intensidade, saídos do sintetizador de Andy Gillespie e que servem de pano de fundo, batidas fortes e ritmadas firmadas na percussão de Mel Gaynor e programação de bateria, secundadas por linhas de baixo rápidas e rasgadas aqui e acolá pela guitarra ora mais nervosa ora mais sincopada e cintilante de Charles Burchill.

Uma cadeia sonora a emoldurar a lírica fraseada de Jim Kerr, escorreita mas também mais “económica” – mais intimista e nostálgica e distante do activismo político e ideologia social que marcaram alguns dos mais fortes temas de finais da década de ’80 e parte dos anos ’90 – e superpovoada de hooks melódicos, ainda que não menos emotiva, atirada num timbre mais canoro, suave e por vezes sussurrante, longe da projecção empolgada e impactante de outros tempos.
Dando um desconto à comparação, a colocação e entoação de Big Music (tema que dá nome ao álbum) ou Broken Glass Park, por exemplo, fez-me recuar a alguns dos temas mais bem sucedidos desse camaleão da pop/rock David Bowie.

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Temas como Blindfolded, (o qual de imediato me sugeriu os ritmos de uns electrizantes Muse), Midnight Walking, Honest Town, Human, por seu turno, invocam muitos hits de uma crescente pop electrónica da década de ‘90 passada. Blood Diamonds não ficaria mal num remake de um dos êxitos dos Human League de outros tempos e temas como Let The Day Begin, Concrete And Cherry Blossom ou Kill Or Cure com Burchill a dedilhar uma guitarra mais sofrida a dilacerar a batida tecnho que marca compasso, até não destoaria de um qualquer dos discos dos U2 da última década, com Kerr a dar um pouco mais de força à colocação de voz, se bem que distante do timbre de Bono.

Imagination acelera para uma “disco sound” travestida de um house quebrado pelos riffs de guitarra, enquanto Spirited Away, um dos temas mais suaves do disco, evoca um retorno a algum do melhor pop atmosférico dos anos ‘80.

Tudo isto resulta num conjunto de canções de fácil audição e aptas para colocar a audiência a cantarolar os refrões enquanto dá uns passos de dança. Resta saber até que ponto esta possível amálgama de temas antigos e novos resultará numa recepção positiva, diante de uma audiência provavelmente formada, na sua maioria, por gente mais “madura”, ávida de ver ou rever os ídolos de décadas passadas.

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Texto: Marcelo Neves

Fotos: Divulgação