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Urna de Margarida Sousa Uva coberta com colcha da Eternidade

Quando a urna de Margarida Sousa Uva, mulher de Durão Barroso que morreu na quinta-feira vítima de cancro, saiu da Basílica da Estrela, em Lisboa, no dia do funeral, houve um pormenor que saltou à vista.

A colcha que cobria a urna não era uma colcha normal. Os bordados, o material, os apontamentos de cor e os pormenores dos desenhos captaram a atenção e fascinaram pela beleza, não muito usual neste tipo de cerimónias.

A redação da Move Notícias foi saber mais sobre a história e o significado da colcha e esta foi a primeira conclusão: simboliza a Eternidade.

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São os Bordados de Castelo Branco. De origem desconhecida, tiveram o auge da sua produção no século XVIII e foram recuperados pela albicastrense Maria da Piedade Mendes no século XIX, que “encontrou um conjunto de colchas de linho bordadas a seda, guardadas religiosamente em arcas herdadas pela sua família, e que iriam servir de modelo para os trabalhos que desenvolveu ao longo da vida com uma perfeição notável”, refere o site da Câmara Municipal.

Linho, porque naquela região havia muito, e seda, pela criação em larga escala do bicho-da-seda em Castelo Branco.

Comecemos pelos desenhos e os seus significados.

“O Cravo aparece como elemento dominante, espalmado ou de lado, de pétalas separadas e rebordos denteados, é flor resistente, erecta, símbolo da provocaçăo, da virilidade”, lê-se na página.

“A peónia, o lótus, o crisântemo e o botăo de ameixieira , muito populares na civilizaçăo chinesa, associadas respectivamente à Primavera, Verăo, Outono e Inverno, săo flores que vulgarmente podem ser observadas no Bordado. A Primavera é representada também pela magnólia. A peónia sugere ainda, a salvaçăo, a castidade. O lótus, espécie de nenúfar azul, na iconografia budista chinesa significa pureza”.

As flores são aliás muito usuais nestas colchas.

“A túlipa, flor recorrente no Bordado de Castelo Branco, existia com abundância nos jardins palacianos do país, principalmente nos da corte, e sujeita a grande reserva para evitar que a sua popularizaçăo lhe retirasse o carácter aristocrático tornou-se símbolo de riqueza e ostentaçăo”, continua.

Mas o pormenor mais importante nos bordados da colcha que tapou a urna prende-se com a simbologia da árvore da vida e do pavão. Desenho bem visível no manto.

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“A Árvore da Vida é uma temática presente em numerosas religiőes, associada à vida em perpétua ascensăo para o céu, evoca todo o simbolismo da verticalidade. Muito utilizada no Oriente, em especial no Irăo, é representada assiduamente entre dois animais afrontados”, começa por explicar a autarquia.

“Se aparecer conjugada com o pavăo, evoca a Eternidade e a Ressurreiçăo. Caracteriza-se pela existência de um elemento central, assimétrico, que emerge de um conjunto de montículos, formados por diversos ramos ondulantes, revestidos de folhagens, flores e frutos, onde pousam aves coloridas”.

Não se sabe de quem partiu a escolha do uso desta colcha no funeral de Margarida Sousa Uva. Uma mulher, que não gostava de protagonismo, mas que era reconhecidamente uma pessoa de causas.

Perto da residência da família Durão Barroso, no Jardim das Amoreiras, existia uma fábrica – atual Museu Arpad – destas colchas. Apesar de discreta e sofrida, Margarida Sousa Uva é também descrita pelos amigos como alguém que valorizava muito os detalhes. Seguramente que a escolha da colcha não foi um mero pormenor.

Fotos: Sílvia Santos