Dantas Rodrigues

Advogado

Soluções para a violência doméstica

Ao longo dos últimos anos, profession oblige, tenho acompanhado muitas situações de violência e maus tratos, em que as vítimas, temendo sofrer as piores humilhações por parte dos seus agressores, preferem ficar mudas, fingindo que nada aconteceu. E, como se tudo isso não bastasse, a própria decisão de entrarem numa esquadra de polícia costuma ser bastante penosa, até pelo simples facto de se terem de sujeitar a indesejáveis exposições.

Para minorar tal problema, a freguesia de Santo António, em Lisboa, através de um recente protocolo celebrado entre o Hospital dos Capuchos e o Comando Metropolitano de Lisboa da Polícia de Segurança Pública, abriu um espaço ao qual se acede pelo interior daquele estabelecimento clínico, a fim de que as vítimas de violência doméstica possam apresentar as suas queixas ao abrigo de todo e qualquer olhar indiscreto. O dito espaço permanecerá aberto durante 24 horas e foi crismado de «Espaço Júlia» – nome de uma anterior vítima de violência doméstica assassinada pelo marido, com o qual se encontrava matrimoniada há mais de trinta anos.

A ideia contribui para tornar muito mais discreto e bem menos agressivo o ambiente, em tudo oposto ao de uma típica esquadra de polícia, por definição impessoal e protocolar. Passando pelo interior do Hospital, a vítima sente-se naturalmente muito mais confortável em depor contra quem a agrediu, do que se tiver de se dirigir à esquadra do bairro onde reside com o seu agressor.

O passo seguinte a dar – mais ousado, sem dúvida, mas não menos importante – será talvez o de se criar um «juízo de família integrado», ou seja, uma família/um juiz, a fim de que toda a conflitualidade de uma mesma família possa ser dirimida por um único e mesmo juiz.

Se isso vier a acontecer, o mesmo juiz acompanhará então uma determinada família no decorrer dos seus conflitos, sejam eles no âmbito do direito da família, sejam eles do foro do direito penal. Caber-lhe-á estabelecer o regime das responsabilidades parentais e decidirá dos eventuais incumprimentos. Em caso de divórcio, procederá à tentativa de conciliação dos cônjuges e, na impossibilidade de promover essa conciliação, procurará obter o acordo de ambos para a conversão do divórcio sem consentimento em divórcio por mútuo acordo, homologando o respetivo processo. Por fim, o mesmo juiz definirá as penas e os meios de proteção à vítima de violência doméstica e familiar.

Um só juiz, ao dirimir todos os conflitos de uma mesma família, adquire, inquestionavelmente, um conhecimento global da problemática social que a envolve, tornando-se mais capaz de tomar decisões consistentes e destinadas a solucionar todos os problemas de forma adequada. E ao longo do seu percurso profissional, o acompanhamento que fará a essa mesma família, não apenas assegurará a sua confiança como, sem dúvida, conduzirá a uma notória redução dos riscos que eventualmente possam vir a desembocar em comportamentos violentos.

Esperemos que o futuro ministro da Justiça se preocupe efetivamente com a violência doméstica e inove criando um juízo verdadeiramente especializado em família.

**Por Dantas Rodrigues, sócio-partner da Dantas Rodrigues & Associados